A Biblioteca Nacional de Portugal adquiriu em Novembro de 2008, no leilão da Biblioteca de José Joaquim Oliveira Bastos organizado por Manuel Ferreira, com o patrocínio da Associação de Amigos da BNP (
AABNP), catorze importantes cartas autógrafas de Almeida Garrett (5) e de Alexandre Herculano (9).
As cartas de Almeida Garrett estão datadas de 1828, 1838 e 1845 e foram enviadas a António Ferreira Velho (a de 1828) e a Francisco Joaquim Maia (duas de 1838 e uma de 1845), ambos ilustres portuenses. O conteúdo da carta enviada a Ferreira Velho, escrita imediatamente antes do segundo exílio do autor de
Camões, espelha bem o conjunto de vicissitudes por que passavam os escritores e intelectuais portugueses pelo primeiro quartel do século XIX, a braços com o financiamento das suas iniciativas editoriais, no caso a do
Parnaso lusitano ou poesias selectas dos autores portuguezes antigos e modernos, que veio a lume entre 1826 e 1834, em Paris, pela mão do editor Aillaud e que, como é sabido, abre com o célebre
Bosquejo da historia da poesia e lingua portugueza de Garrett. Já as cartas enviadas a Francisco Joaquim Maia são de cunho marcadamente político, três delas remetidas dois meses após o juramento da Constituição de 1838 (Abril), tempo em que Garrett se envolve e revolve nos afazeres eleitorais e se confessa um «moderado» que tendo lamentado «sinceramente a perda da Carta [Constituicional]», não entendeu, «nem entendo que os males da Revolução se podiam sanar com a espada».
Seis das cartas de Alexandre Herculano parecem ter sido igualmente enviadas a Francisco Joaquim Maia, pelos anos de 1840 a 1846, versando também assuntos políticos e eleitorais, em termos, aliás, lapidares: «Esta tem por objecto principal a política, na qual, sem que eu saiba bem o como me acho outra vez metido. Falo das Eleições» (6.III.1840). Era a tempo de oposição ao Setembrismo, do caciquismo eleitoral, dos favores e dos empenhos. E Herculano, no seu mais exímio jeito epistolográfico, tudo aquilo vai comentando com sábia ironia.
As outras três cartas, com as datas prováveis de 1842, 1844 e 1857, foram dirigidas a “Senhora não identificada”, como se diz no Catálogo do Leilão, Senhora que nunca havia descido do Porto a Lisboa (di-lo o próprio Herculano, «encarrapitado no alto da Ajuda», o seu «ermitério»), decerto das relações de Francisco Joaquim Maia, se não ser a própria esposa daquele correligionário político, de que o poeta da
Harpa do Crente se diz obrigado por mil «mimos» e obséquios recebidos. Nestas, dá Herculano largas à sua melhor verve literária e, uma vez mais, fina ironia, dizendo-se «metido em poeira de livros, que é uma delícia. Nascem todos os portugueses para caranguejos; porque a nação não é mais do que uma grande caranguejola a andar para trás: eu fui porém exceptuado, porque nasci para traça; aqui vou cumprindo o meu fado e roendo mestres defuntos.»
O sítio do Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea da BNP fornece mais informações sobre outros autógrafos de Garrett e Herculano guardados na BNP em
http://acpc.bnportugal.pt/ .