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Agustina Bessa-Luís: Vida e Obra (BNP, 2009)


Agustina Bessa-Luís

(1922-2019)

NOTÍCIA | 3 junho 2019

“Agustina é, depois de Fernando Pessoa, o segundo milagre do século XX português e será reconhecida quando, com a distância, se puder medir toda a sua estatura, como a contribuição mais original da prosa portuguesa para a literatura mundial, ao lado do brasileiro Guimarães Rosa…”
(António José Saraiva; 1984)


“Indomável”, a considerou Eduardo Lourenço. Como sendo “genial e vulcânica”, a interpretou Manoel de Oliveira.

Falando de O Livro de Agustina (a sua espécie de autobiografia), Jorge Marmelo intitulou o artigo como “Autobiografia de uma mulher de sal e vinagre”, baseado numa frase do próprio texto de Agustina, onde esta parece retratar-se:

“Meu pai, levado por um tio que tinha comércio de frutas na Baía, foi colocado no Rio, não sei se numa pastelaria onde o deixaram comer doces até os ter por inimigos para o resto da vida. Creio que me transmitiu o desinteresse pelas coisas doces. Será por isso que eu prefiro o sal e o vinagre.”

Numa entrevista concedida a Maria Leonor Nunes, intitulada (não por acaso), “Para Além do Mal”, a propósito do seu romance, Joia de Família, responde, de forma interessante, à última pergunta: “O que faz um bom escritor?”:

“– Primeiro que tudo, ser um sem-vergonha. O escritor é um delinquente. Vê-se a facilidade com que matam as personagens… Exemplo disso, é o Cela, uma pessoa insuportável, um sem-vergonha, mas que escreve… o Poe era um génio espantoso. Também o Kafka dos pequeninos textos. De resto, eu também me sinto melhor neles. São mais empolgantes. Sou capaz de ser totalmente escritora, de estar mais presente num pequeno texto do que num romance de muitas páginas.”

A ideia de que é preciso ser odioso aos outros, para se tornar bom escritor, transporta-a para Camilo (“esse génio a retalho”), em Camilo, Génio e Figura:

“Camilo não acreditava no infortúnio, ele é sempre uma condição dos outros, um acontecimento estranho à nossa capacidade vital. Mas sabia-se capaz de chamar as causas do infortúnio, de praticar erros temporais, pela sua tumultuosa necessidade de ser ameaçado, de converter-se num objecto de perseguição, de ser tão odioso quanto possível para obter o clima criador, que é refractário à simpatia…”

De qualquer forma, a felicidade do escritor, está na escrita, como ratificou numa “conversa” com Mário Cláudio, quando este lembrava uma frase de Alberto Serpa (“Eu, como escritor, tive uma vez uma alegria – aquela que deriva da própria escrita”):

“…Pois é, é a principal. Estar fechado num quarto ou numa sala, e para outros aquilo é impensável estar ali fechado dias a fio., com livros de um lado e do outro, e no fim disso ter uma página, ou vinte, ou o que seja, escrita. É qualquer coisa que não se troca por nada.”
(JL, 14 de janeiro de 1998).

Assim, será: A felicidade do escritor, está, assim, na própria escrita. A nossa de leitores, na possibilidade de aceder a essa escrita.

Três escritores se cruzaram hoje, como o acerto de um destino: Camilo suicidou-se, fez há dois dias,129 anos. Kafka morreu, neste mesmo dia, há 95 anos. Agustina, dizem que nos deixou hoje. As suas vidas estão nos livros que nos deixaram. Nós, leitores, ficamos com a felicidade de continuarmos a lê-los.

Maria do Carmo Sequeira