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Horário

2.ª - 6.ª 09h30 - 19h30

sáb.  09h30 - 17h30

 

Folha de sala

 

Visita guiada

por Pedro Piedade Marques

15 mar. | 17h00

3 maio | 17h00

Entrada livre / Este endereço de e-mail está protegido de spam bots, pelo que necessita do Javascript activado para o visualizar

 

Editor Contra: Fernando Ribeiro de Mello e a Afrodite (venda online)

 

Colóquio (2016)

Uma «insólita ofensiva de corrupção»: nos 50 anos dos processos à Afrodite no Tribunal Plenário

 

Demonstração: O Homem do Saco

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Apoio: 


«Insólita ofensiva de corrupção»: a Afrodite de Fernando Ribeiro de Mello durante o Estado Novo (e depois)

EXPOSIÇÃO | 1 mar. - 1 jun. '17 | Sala de Referência | Entrada livre

Coube ao implacável censor Joaquim Raymond Palhares, chefe do “Serviço de Leitura de Livros” da Direção dos Serviços de Censura, num relatório assinado a 12 de Setembro de 1966, a autoria da frase com que, através dele, o regime definia o primeiro ano de atividade da Afrodite e do seu editor, Fernando Ribeiro de Mello (1941-1992): “uma insólita ofensiva de corrupção”.


Tão insólita que se impunha o devido corretivo: um ano após o seu arranque, este pequeníssimo projeto editorial “larvar” e semi-ilegal (se não completamente ilegal, na medida em que nunca se registou como associado do Grémio de Editores e Livreiros) tivera todos os seus livros proibidos pela Censura, com dois deles – a Antologia da Poesia Portuguesa Erótica e Satírica, coordenada por Natália Correia, e A Filosofia na Alcova do Marquês de Sade – alvos de outros tantos processos por “abuso de liberdade de imprensa”, delito gravoso que era julgado sem apelo nem agravo nos Tribunais Plenários.


Proibidos (e não só)

Ribeiro de Mello foi assim o único editor levado a tribunal e condenado durante o Estado Novo, procedimento ao qual o regime sempre preferira a rotina do exame censório das edições e sua mais ou menos discreta purga policial em armazéns e livrarias.


Além destes dois títulos, também o Kamasutra, a Vénus de Kazabaika de Sacher-Masoch, a Antologia de Vanguarda e O Vinho e a Lira de Natália Correia foram proibidos, a que se juntariam depois mais duas edições, a Antologia do Conto Abominável (1969) e o Anti-Duhring de Engels (1971). Sujeitos a outro tipo de constrangimentos censórios (como a proibição de publicidade e de referências críticas na imprensa) seriam o Manual dos Inquisidores (1971), o Livro de S. Cipriano (1971), A Sociedade do Espetáculo de Guy Debord (1972) e o Apocalipse do Apóstolo João (1972).

Editor contra

 

Começando a sua carreira defendendo-se em tribunal do Estado português, Ribeiro de Mello acabou-a, vinte anos depois, de novo em tribunal e mais uma vez contra o Estado. Vítima indireta das vicissitudes políticas e económicas da conturbada situação nacional após a Revolução (por via da nacionalização da distribuidora Expresso, e sua calamitosa gestão, cujos efeitos foram catastróficos para o estado financeiro da editora), a Afrodite terá também sofrido com a incapacidade do seu editor em definir-se face à mudança repentina de paradigmas: o que era proibido e arriscado até 1974, e que garantia a identidade ao seu catálogo, passou a ser autorizado. Como escreveu Aníbal Fernandes, da noite para o dia “puderam muitos ribeiros-de-mello aparecer”, como “cogumelos da oportunidade”.


Ainda assim, apesar de escolhas de difícil defesa como a primeira edição nacional de Mein Kampf (1976) e uma série de livros “oportunistas” que exploravam as fissuras na propaganda soviética (um dos quais, 26 Anos na União Soviética de Francisco Ferreira, se tornou um best-seller), a Afrodite fez juz à sua fama anterior publicando Alfred Jarry (O Super Macho), Luiz Pacheco (Textos Malditos), o manual de “resistência” Pequeno Livro Vermelho do Estudante (que causara escândalo e proibições onde fora publicado) ou o teatro de Natália Correia (incluindo uma luxuosa edição de Erros Meus, Má Fortuna, Amor Ardente em 1981) .


Admitindo, num raro depoimento em 1990 sobre a sua carreira, que o tempo de “editar contra” passara, Ribeiro de Mello preparava-se por essa altura para publicar a terceira edição de uma das suas célebres antologias, a do Conto Fantástico Português, no seguimento de um aperfeiçoamento do seu catálogo anterior a 1974 que começara precisamente logo após a Revolução. A sua morte em Fevereiro de 1992, quando tinha pouco mais de 50 anos, pôs o fim definitivo à Afrodite.


No zénite da sua produção editorial (que correspondeu aproximadamente ao consulado de Marcello Caetano e aos dois primeiros anos do Portugal democrático), os livros da Afrodite eram “objetos quase ostensivos na sua originalidade conceptual” (Vitor Silva Tavares).

Uma exposição

Esta exposição na Biblioteca Nacional de Portugal marca a primeira homenagem pública ao editor da Afrodite (se excetuarmos uma sessão de “pré-apresentação” do livro Editor Contra em Maio de 2015, que contou com a presença do autor e de Vitor Silva Tavares).


Para além de uma amostra da bibliografia da editora e de exemplos dos ecos que ela teve na imprensa, pretendeu-se incluir também um grupo de edições de “contexto”, livros que, sobretudo no arranque do projeto, estariam no radar do editor como modelos ou referências (exemplos das edições da Contraponto de Luiz Pacheco, da Minotauro ou da Ulisseia na fase em que Vitor Silva Tavares a dirigiu). Nesse grupo se incluem edições de Jean-Jacques Pauvert, cujo L’Affaire Sade de Maurice Garçon (1957) foi notório modelo na argumentação do advogado de defesa de Ribeiro de Mello no processo à edição da Filosofia na Alcova, Manuel João da Palma Carlos (e modelo também para outra edição referente a outro processo famoso então, o L’Affaire Lolita do editor Maurice Girodias e da sua Olympia Press). O objetivo foi o de tornar claro que os processos à Afrodite, raríssimos no panorama editorial nacional no Estado Novo, se inseriam num contexto internacional de luta de alguns editores em tribunal pela liberdade de expressão e publicação (luta que passava o Canal da Mancha e o Atlântico, para incluir a Penguin de Londres e a Grove Press de Nova Iorque).

 

Os livros, materiais de imprensa e documentos de arquivo expostos que não pertencem aos fundos da Biblioteca Nacional foram cedidos pelo autor ou são cópias de documentos amavelmente cedidos por Antonina Ribeiro, Francisco Alves e Vitor Silva Tavares para a produção do livro Editor Contra.


Pedro Piedade Marques
Comissário

 

Agradecimentos:
Isabel M. Mendes Ferreira
Paulo da Costa Domingos
Rui Seybert Ferreira